E não é que o Rio Pinheiros pode inspirar e abrigar vida, mesmo que sua cor e odores nos façam crer piamente que não? Pois é, um dia desses me deparei com um “suicida” prestes a pular no rio. Atravessava a Ponte da Cidade Universitária quando olhei para o lado e vi aquele senhor careca, trajando camiseta regata e cueca brancas. O susto durou apenas alguns segundos. Com o trânsito parado pude observar com mais atenção e perceber que se tratava de um “boneco”, na verdade uma obra de arte, descoberta feita ao chegar de volta em casa e pesquisar na internet sobre o assunto.

Vida no Rio Pinheiros. Família de capivaras / Reprodução da internet

Vida no Rio Pinheiros. Família de capivaras / Foto: Renata Falzoni

Eduardo Srur, artista plástico e ativista, havia dado inicio a sua mais nova exposição/intervenção artística. Periodicamente ele realiza intervenções urbanas em torno do Rio Pinheiros para chamar a atenção para questões ambientais e urbanas urgentes. “As Margens do Rio Pinheiros” visa promover a conscientização das pessoas, a formação do olhar e chamar a atenção da sociedade para a necessidade de recuperação da bacia hidrográfica do Rio Pinheiros.

"As Margens do Rio Pinheiro" por Eduardo Srur / Foto: zupi.com.br

“As Margens do Rio Pinheiros” por Eduardo Srur / Foto: zupi.com.br

Funcionou! Não que eu não tivesse consciência da atual situação do Rio Pinheiros, ao contrário. A obra de Eduardo Srur me trouxe lembranças de quando pegava o trem para ir ao trabalho em uma das agências pelas quais passei como publicitário. Durante meses foram idas e vindas no trem a margem do Rio Pinheiros. Observador e sensível, os sentimentos e pensamentos logo transbordaram em forma de palavras. Desci do trem e apertei o passo até o escritório. Precisava urgente colocar no “papel” tudo aquilo. Chegando mais rápido do que o de costume, mal cumprimentei os colegas, sentei apressado e liguei o computador.

Era fim de ano, passaríamos de 2012 para 2013, e meus pensamentos acabaram dando origem a um poema. Poema que trouxe um desabafo de quem, naquela época, já sabia da escassez da água. Desabafo de quem tem na água fonte da vida. E com essa mensagem de reflexão, meu desabafo foi parte do post de fim de ano da agência que desejava:

Que a correnteza nos leve por caminhos melhores em 2013 (repost Trianons)

agua

Foto: reprodução da internet

Esses são os votos da Trianons para todos que compartilham da necessidade de uma sociedade em harmonia. Nem só de inovação e tecnologia é o dia a dia aqui na agência. O lado humano é fundamental e valorizamos a evolução constante da nossa equipe como agentes transformadores desta sociedade. A crônica do Théo é carregada em lamentação e melancolia, mas também nos traz a oportunidade de reflexão neste novo ciclo que se inicia.

“Procuro com meus olhos

Uma gota de água cristalina,

Vida em meio a embalagens vazias.

Na janela a revelação diária assusta,

Não há diferença nas margens do rio.

De um lado e do outro somos todos culpados,

Com a alma suja e sem qualquer sensibilidade.

Sigo pelo trilho todos os dias,

Mas não me acostumo com o que vejo no caminho:

Sorri com uma família de capivaras reunida,

Mas a esperança logo se perdeu ao enxergar

Uma ave frustrada buscando alimento em meio aquela água parada.

A correnteza não é capaz de levar toda a sujeira.

A chuva não é capaz de nos lavar a alma,

Pior, inunda o rio e nos submerge em toda essa podridão.

Água desde sempre fonte da vida e espelho quando cristalina,

Da janela do trem que pego todo dia

Hoje reflete, turva, o desrespeito com a vida.

Penso como estará toda aquela gente

Que economiza saliva para não secar de vez o corpo que padece diário

E têm no rosto o sorriso fechado.” – por Théo